Em recentes artigos e posts, Jim Highsmith, consultor executivo da Thoughtworks, vem se dedicando a descrever o que chama de “Liderança Adaptável”: um conjunto de habilidades e atitudes que um líder deve desenvolver quando inserido em uma empresa que busca agilidade.
Percebe-se que essas habilidades preenchem uma lacuna existente em muitas organizações, que, ao adotarem agile, interpretam auto-organização como algo que surgirá espontaneamente nos times, sem a necessidade de uma liderança que atue como vetor para um novo modelo mental a ser desenvolvido.
O resultado, muitas vezes, é uma implementação mecânica, na qual encontram-se sprints e backlogs, mas pouca efetividade nos momentos de inspeção e adaptação – o time patina e não consegue melhorar seu desempenho.
Para evitar este quadro e alcançar resultados relevantes em uma organização que busca agilidade, Highsmith destaca que a liderança desempenha papel chave. Em “Adaptive Leadership: Accelerating enterprise agility”, o autor define a liderança adaptável como:
O trabalho de habilitar times a entregar valor de negócio rapidamente e de maneira confiável – através do engajamento de clientes e do aprendizado contínuo, além da adaptação a um ambiente em mudança permanente.
Para se tornar um líder adaptável, é necessário o desenvolvimento de quatro habilidades: Adaptação, Exploração, Facilitação e Conciliação de Opostos. Exploramos os detalhes a seguir.
1. Adaptação
Um gerente tradicional busca seguir um plano através de mudanças mínimas, enquanto um líder ágil concentra-se em se adaptar com sucesso a mudanças inevitáveis. Entretanto, a adaptação e o planejamento não são práticas excludentes; deve-se fazer ambos:
Falhas em previsões e no planejamento levam a retrabalhos desnecessários – e a insucessos. De forma análoga, tentar antecipar o desconhecido leva a expectativas e a planos pouco realistas. Os planos evoluem a partir do que sabemos; as adaptações são respostas para o aprendizado daquilo que não conhecemos.
Um líder deve promover a adaptação através da ênfase em colaboração, interações constantes e coragem para experimentar e inovar. Obviamente, isto incorrerá em falhas, mas é necessário perceber que este processo é o natural em ambiente complexos – como o contexto de negócios atual, cheio de ambiguidades e incertezas. Uma boa referência relativa a esta linha de pensamento é a palestra “Tentativa, erro e o Complexo de Deus”, do TED (estão diponíveis legendas em português).
2. Exploração
O conceito de explorar é similar ao de adaptar, porém mais voltado ao como responder às mudanças. Troca-se então a dupla planejar–executar pelo processo criar visão–explorar.
Mais uma vez, não se está dizendo que o planejamento deva ser ignorado, apenas que não é assumido o compromisso de saber, de antemão, uma sequência de tarefas que levará ao sucesso.
Em lugar disso, o líder deve primeiramente concentrar-se em criar uma visão compartilhada do que se busca atingir. Depois, planeja-se um pouco, executa-se um pouco e planeja-se novamente. A exploração está no núcleo deste processo, não de forma aleatória, mas sim orientada pela visão criada inicialmente.
Enquanto os requisitos e o design são voláteis, e por vezes nebulosos, a visão é clara e estabelece um objetivo maior, além de trazer um sentimento de urgência a todos os envolvidos.
O líder tem participação direta no estabelecimento da visão e em seu uso para guiar um trabalho exploratório. Esse trabalho é feito em um ambiente em que a equipe se sente confortável em assumir riscos, visando atingir um objetivo maior estabelecido.
3. Facilitação
Ser um facilitador significa desenvolver um estilo de liderança servidora, que requer conceitos sólidos de missão e visão, e cujo foco concentra-se em desenvolver pessoas, contribuindo para a formação de bons times autogerenciáveis. Isto não significa, no entanto, abdicar da autoridade e da tomada de decisões.
Em outro post sobre a liderança adaptável, Jim Highsmith cita que uma das principais formas de colaborar com o time é absorver ambiguidades. Em muitas situações de dúvida, não existe uma alternativa claramente mais indicada, e o time pode se perder em debates intermináveis.
Cabe ao líder, nesses casos, absorver o impacto da incerteza, ser transparente com a equipe e definir o direcionamento, dizendo algo do tipo: “Certo, a informação disponível não é clara o suficiente, mas para dar andamento ao projeto, vamos escolher a opção A e deixar a B em segundo plano”.
Sugere-se alguns cuidados para que a tomada de decisão do líder não afete a autonomia da equipe. Decisões unilaterais ou realizadads após consulta devem ser uma exceção, limitadas a poucos casos por mês. Se decisões desse tipo fazem parte da rotina diária, provavelmente o líder está mergulhado em detalhes, e a equipe não consegue desenvolver seu autogerenciamento.
4. Conciliação de opostos
A quarta habilidade citada por Highsmith é o estilo de liderança “E” em lugar de “OU”. Isto consiste em enfrentar situações cujas alternativas de solução são aparentemente paradoxais, mas a partir delas criar uma nova solução, que contém elementos das anteriores, mas é superior às duas isoladamente.
Um exemplo citado pelo autor é CMMI X Agile. É comum encontrar defesas apaixonadas de um em detrimento de outro, mas é possível combiná-los de maneira benéfica para a organização. Um estudo de caso sobre isso, com a participação de Jeff Sutherland, pode ser encontrado aqui.
Um líder adaptável tenta utilizar o que há de melhor em cada uma das alternativas de que dispõe, analisando-as a partir do contexto em que atua (cultura organizacional, mercado, maturidade do time etc). Desenvolver esta habilidade requer um exercício contínuo de enxergar as coisas sobre diferentes pontos de vista, libertando-se de conceitos preestabelecidos.
É muito mais fácil ser um líder “OU”, ou seja escolher uma causa e defendê-la insistentemente até que o outro lado desista. Contudo, em um cenário turbulento e em contínua mudança, seguir o raciocínio de buscar apenas uma alternativa correta entre as diversas opções existentes pode significar uma receita para o fracasso.
Conclusões
O caminho para tornar-se um líder adaptável é longo: durante o percurso é necessário abandonar o peso de conceitos preestabelecidos e o conforto de atividades conhecidas, construindo-se uma nova forma de pensar e agir.
Durante esta caminhada, haverá muitos ganhos ao utilizar como apoio as habilidades mencionadas neste artigo. Explore possibilidades, adapte-se ao grupo, construa novas opções a partir das preexistentes. Sobretudo, não tenha medo de errar. O resultado será recompensador.
Sobre o Autor
Vinícius Veloso é CSPO, Bacharel em Ciência da Computação e Coordenador de Sistemas. Tem quatro anos de experiência intensiva em projetos de melhoria de processo utilizando Scrum, CMMI e MPS.BR.