O mês de maio trouxe novos releases de duas das principais distribuições da comunidade do Linux: Fedora 17, Ubuntu 12.4, além da continuidade da distribuição "alternativa" Mint 13 e o renascimento da que já foi a distribuição preferida dos brasileiros, o Mageia (ex-Mandriva, ex-Conectiva). Aproveitamos essa sequência de lançamentos para apresentar um panorama das distribuições Linux mantidas pela comunidade.
Gigantes em movimento
O Ubuntu era considerado como o Linux mais amigável para usuários finais e também por isso um dos preferidos dos desenvolvedores. Mas a introdução da nova interface com o usuário, o Unity, há dois anos, fez com que vários usuários buscassem alternativas, entre elas o Mint e o Fedora. Apesar disso, o Ubuntu continua sendo considerado a distribuição mais popular, e seu patrocinador, a empresa Canonical, está usando a distribuição como base para novas investidas em serviços de nuvem e eletrônica de consumo. A Canonical também quer posicionar a edição servidora do Ubuntu como uma alternativa corporativa para o RHEL e o SuSE.
Já o Fedora é a base para a distribuição comercial líder de mercado, o Red Hat Enterprise Linux. É também a plataforma de desenvolvimento preferencial para vários grupos na comunidade open source, entre eles, desenvolvedores do Kernel do Linux. Isto deu ao Fedora uma fama de "instável", pois ele geralmente traz novidades, algumas vezes incompatíveis ou imaturas, antes de outras distribuições, para fomentar o amadurecimento destas funcionalidades. Entretanto muitos usuários e desenvolvedores corporativos estão encontrando no Fedora uma plataforma amigável e estável, perfeita para o dia-a-dia.
Só que o Fedora, ao apostar no Gnome 3 e sua nova interface com o usuário, o Gnome Shell, também desagradou a uma quantidade significativa de usuários fieis, entre eles o próprio Linus Torvalds, criador do Linux e ainda hoje o líder de projeto do kernel. O resultado é uma oportunidade para o crescimento de outras distribuições de comunidade, como o Mageia, ou para a migração de usuários do Fedora para derivados do Ubuntu como o já citado Mint.
Novidades no Fedora 17
O Fedora 17 "Beefy Miracle" é baseado no Kernel 3.3 e traz o Gnome 3.4, que continua em sua revisão para se tornar um desktop universal, adequado tanto a PCs tradicionais quanto a tablets e outros dispositivos baseados em toque. Assim como ocorreu com o Unity do Ubuntu, as mudanças não encontraram aprovação unânime da comunidade, mas agora o Gnome Shell pode ser utilizado com todas as suas firulas visuais mesmo em computadores sem placa gráfica com aceleração 3D, ou ainda dentro de máquinas virtuais VMware, Virtual Box, KVM e Xen. Também é possível usar melhor o novo desktop em configurações com múltiplos monitores (ou com um projetor externo) que antes exigiam o "modo de reserva".
Outra novidade do Gnome 3.4 é a integração com contas online, por exemplo Google e Twitter, de modo que notificações de IM e redes sociais, ou arquivos armazenados em serviços de nuvem, sejam vistos lado-a-lado com recursos locais.
O ambiente educacional Sugar, utilizado por iniciativas como o OLPC (Um Laptop para Cada Criança) agora foi atualizado para a nova versão do Gnome e é suportado tanto como desktop de usuários no novo Fedora, quanto como alvo para desenvolvedores especializados nesta área.
O Fedora 17 traz o Gimp 2.8, popular aplicativo para edição de imagens, que agora oferece a opção de interface de uma única janela, facilitando a migração dos que antes usavam Photoshop. Outra novidade é o Gnome Boxes, uma interface genérica para acesso a máquinas virtuais locais ou remotas.
Cenários como call centers e quiosques poderão se beneficiar do recurso de multi-seat, que permite conectar vários conjuntos de placa de vídeo, monitor, mouse e teclado, criando efetivamente um sistema multiusuário. Docking stations USB compatíveis com Display Link, por exemplo da empresa Plugabble, são suportadas nativamente e usuários reportam o uso de mais de 8 "estações" sem perda de desempenho, em computadores com processadores i5 da Intel.
Fedora 17 para desenvolvedores e sysadmins
Para o desenvolvedor Java, o Fedora 17 agora usa o OpenJDK 1.7 como o Java default; incorpora o novo release continuado do Eclipse, o Juno, mas ainda não traz os plugins do WTP para desenvolvimento Java EE (plugins para PHP, Ruby e JavaScript estão inclusos, além de C/C++). O OpenJDK 1.6 não é mais oferecido como parte da distribuição, o que pode complicar a vida de desenvolvedores utilizando bibliotecas e aplicações que ainda enfrentam problemas de compatibilidade com o JDK mais recente.
A distribuição traz pela primeira vez o JBoss AS, na versão 7.1.1, mas apenas na edição certificada para o Web Profile. Infelizmente os usuários encontram ainda dificuldades no uso do JBoss Tools (extensões para o Eclipse criadas pela própria comunidade do JBoss) juntamente com o servidor de aplicações embutido no Fedora.
Também estão inclusas as últimas versões do PHP, Ruby, JRuby, Mono e do GCC. Como todos os pacotes da distribuição agora são compilados com o GCC 4.7 pode haver problemas de compatibilidade com binários que funcionavam sem problemas em versões anteriores. Esta mudança afeta especialmente usuários de softwares proprietários.
Outra mudança no Fedora 17 que pode afetar a compatibilidade com aplicações é a unificação dos diretórios /usr/bin com /bin, /usr/lib com /lib e assim por diante, eliminando binários no sistema de arquivos /usr. Este já era o padrão em outros Unixes como o Solaris.
No aspecto de segurança, agora o SELinux pode impedir processos de usar a chamada ao sistema ptrace para monitorar a execução de outros processos. Apenas ferramentas de desenvolvimento, como depuradores, terão esta permissão por padrão. Serviços do sistema agora usam pastas /tmp privativas, e podem ser executadas em uma sandbox baseada em virtualização, proporcionando isolamento mais estrito do que o chroot. O firewall padrão do sistema afora é o firewalld.
O administrador de sistema também encontra no Fedora 17 a nova versão do OpenStack e também o oVirt, plataforma web para gerenciamento de VMs e serviços de nuvem privativos que é a base do produto comercial RHEV (Red Hat Enterprise Virtualization), além do Eucalyptus e Open Nebula.
Em termos de armazenamento, o sistema de arquivos BRTFS ainda não foi considerado "pronto para produção" pela comunidade Fedora, apesar de já ser suportado comercialmente pela Oracle (no Unbreakable Linux) e Attachmate (no SuSE Enterprise). Os desenvolvedores do kernel do Linux também consideram o BRTFS como sendo ainda "experimental".
Ainda com relação a armazenamento, o limite de 16TB para sistemas Ext4 foi removido, e agora o Fedora Linux pode atuar como um NAS de rede, expondo volumes como alvos iSCSI e FibreChannel para outros sistemas.
Mais detalhes sobre estas e outras novidades podem ser encontradas na Wiki do Projeto Fedora.
Novidades no Ubuntu 12.4
O Ubuntu 12.4 é uma versão LTS (Long Term Suport, ou de suporte de longo prazo), que será suportada com atualizações e correções de bugs pelos próximos cinco anos. Versões LTS anteriores do Ubuntu eram suportadas por apenas três anos. Em comparação, um release do Fedora é suportado apenas por pouco mais de um ano. As versões LTS do Ubuntu são certificadas pela Dell, HP e IBM, em vários dos seus modelos de servidores, desktops e notebooks.
O foco do novo release do Ubuntu foi em estabilidade em vez de novidades, mas ainda assim foi introduzido um novo elemento no desktop Unity, o HUD. Ele permite buscas em comandos de menus de aplicações, arquivos recentes, marcadores web e até arquivos de música, permitindo acessar funcionalidades de aplicações pelo teclado de modo mais eficiente do que seria possível por telas de toque ou com mouse. O novo recurso recebeu avaliações bastante positivas.
Na versão servidora da distribuição, a Canonical aposta no suporte ao OpenStack e em várias ferramentas customizadas para provisionamento de VMs e serviços de nuvem, entre elas o MAAS e o Juju. A empresa também oferece seu próprio serviço de nuvem, o Ubuntu One, incluindo ofertas acessíveis também a usuários de outros sistemas como Windows e iOS.
Dentre as distribuições de comunidade, o Ubuntu é a mais "atrasada" em relação ao kernel, utilizando o 3.0.2, enquanto que as concorrentes já citadas estão usando o 3.2 ou 3.3. Mas ainda este ano será liberado o Ubuntu 12.10 com um kernel mais recente. A outra distribuição de comunidade popular, não coberta aqui, o Open SuSE, está no kernel 3.1 mas irá liberar no início de junho o beta da versão 12.2 com o kernel 3.4.
Para os conservadores: Mint 13
A proposta do Mint é atender aos usuários que não gostaram das mudanças de interface com o usuário do Gnome 3 nem do Unity. Ela é uma distribuição derivada do Ubuntu, mas que oferece duas alternativas de desktop:
- MATE, que é um fork, ou continuação não oficial do Gnome 2, e que portanto poderá enfrentar problemas à medida que aplicações são atualizadas para usar bibliotecas do Gnome 3, como o GTK3;
- Cinnamon, que usa os recursos de extensibilidade do Gnome 3 para substituir o Gnome Shell por uma interface com o usuário com o visual e comportamento do Gnome 2, mas preservando a compatibilidade com aplicações baseadas nas bibliotecas do Gnome 3. O Unity também preserva esta compatibilidade.
O Mint 13 é baseado no Ubuntu 12.4 então traz o mesmo kernel, drivers e aplicações, incluindo drivers e codecs proprietários. Ele vem ganhando popularidade rapidamente, e no momento de escrita aparecia como a distribuiçao número 1 no Distro Watch.
O retorno da fênix: Mageia 2
O Mageia 2 é o segundo release do fork da distribuição Mandriva, criado pela sua comunidade de usuários devido às incertezas quando ao futuro da empresa, que já esteve duas vezes em concordata.
Para quem não se recorda, a Mandriva foi formada pela fusão de três empresas dedicadas a suportar suas próprias distribuições comerciais de Linux: A brasileira Conectiva, a francesa Mandrake e a norte-americana Lycoris. Estas empresas suportavam preferencialmente o desktop KDE, enquanto que outras distribuições davam preferência ao Gnome (mesmo o Unity do Ubuntu é baseado no Gnome). Infelizmente a execução da estratégia comercial não foi bem sucedida e o espaço destas distribuições na comunidade e nas empresas ficou bastante reduzido.
O novo release atualiza componentes importantes como o Kernel, desktops Gnome e KDE e aplicações, colocando a distribuição no mesmo nível de "novidades" que o Open SuSE, Fedora, Ubuntu e Mint. A comunidade Mageia não declara sua preferência por nenhum desktop, mas a sua herança é fortemente voltada para o KDE. O Mate e o Cinnamon do MINT também estão inclusos no Mageia.
A comunidade Mageia recusou recentemente uma proposta da Mandriva de trabalhar como parte de uma fundação que seria controlada pela empresa Mandriva, em um estilo semelhante ao Fedora/RHEL, preferindo manter sua independência. A Mageia incorporou sua própria ONG e convidou a Mandriva a se juntar à comunidade, reiterando que nada impede a Mandriva (ou qualquer outra empresa) de criar derivativos comerciais do Mageia, e que a comunidade daria apoio a qualquer produto deste tipo. Provavelmente foi uma boa decisão, visto que a Mandriva está novamente à beira da falência.
Avaliações externas
Há várias avaliações e comparações entre Fedora, Ubuntu, Mint e Mageia disponíveis na Internet. Segue aqui um apanhado representativo para o leitor interessado em mais informações:
- Fedora 15 & Gnome 3.4: Return to a useful desktop (ZDnet)
- Ubuntu 12.4 review (Ken McConnel)
- Linux Mint 14 review: Ubuntu for humans beings (Linux User)
- Mageia 2 review: Pure magic (Linus User)
Download e instalação
O Fedora 17 pode ser baixado via BitTorrent, FTP e HTTP, em imagens ISO para CDs Live ou DVDs (quase) completos para a instalação. Estão disponíveis ainda spins customizados, que são imagens de CD Live trazendo aplicativos voltados para entretenimento, eletrônica ou análise forense (segurança).
Entretanto, softwares e drivers proprietários não fazem parte da distribuição, devendo ser instalados posteriormente usando repositórios de tercerios, como o rpmfusion. As versões mais recentes de drivers proprietários da NVidia e ATI não funcionarão no novo Fedora, sendo necessário aguardar por atualizações futuras com suporte às novas versões do GCC, X.org e kernel.
Usuários de versões anteriores do Fedora podem usar o PreUpgrade, e continuar usando seus sistemas enquanto são baixadas as atualizações, ou então usar o DVD de instalação para uma atualização que preserva arquivos de dados e, dentro do possível configurações de aplicativos.
O Ubuntu 12.4 pode ser baixado em edições desktop, servidora e de nuvem (para IaaS privativas), além de oferecer como opção um instalador que roda diretamente a partir do Windows. Ao contrário do Fedora, todas as imagens de instalação do Ubuntu são CDs.
Desse modo, a instalação de aplicativos e componentes de servidor pode exigir downloads de pacotes adicionais via o Software Center, aplicativo embutido no Ubuntu, e que nas versões mais recentes é modelado de forma semelhante às lojas de aplicativos para plataformas móveis. A vantagem do Ubuntu é já incluir tanto nas imagens quanto em seus repositórios oficiais aplicativos e drivers proprietários, oferecendo suporte imediato a formatos de arquivos MP4, DVDs de vídeo e sites com Flash.
O Mint 13 pode ser baixado como imagens de DVD oferecendo ou o MATE ou o Cinnamon. São imagens pequenas, que poderão demandar o download de aplicações adicionais dos repositórios da comunidade, ou então dos repositórios do Ubuntu e Debian. É oferecido o instalador para Windows, tal qual o Ubuntu, mas não os Live CDs.
Já o Mageia 2 pode ser baixado como imagens ISO para CDs e DVDs, que incluem apenas componentes open source. Aplicativos e drivers proprietários podem ser instalados pelos repositórios non-free e tainted suportados e mantidos pela própria comunidade; ou então usando-se as imagens de Live CD, que já incluem os principais drivers proprietários. Assim não há necessidade de configuração de repositórios de terceiros pelo usuário, ao contrário do que ocorre com o Fedora.
Instalações portáveis, nuvem e suporte a ARM
As imagens de CD Live do Fedora, Ubuntu e Mageia também podem ser instaladas em pendrives, criando assim instalações "portáveis" que podem ser customizadas e atualizadas como se estivessem no HD. Fedora e Ubuntu também liberaram as primeiras versões beta de suas distribuições para os novos desktops e servidores da Dell e outras empresas baseados em processadores ARM, que antes eram restritos a smartphones e tablets.
Ambos Fedora e Ubuntu estão disponíveis também como imagens para instâncias do Amazon EC2.
Qual sua opinião? Diante de tantas novidades e mudanças de rumo, o desktop Linux continuará sendo dominado por Fedora e Ubuntu? Ou será que Mint e Mageia têm chances de se consolidarem como alternativas, devido a usuários insatisfeitos com os desktops com recursos para tablets?