Podemos aprender com outras indústrias, como o setor da aviação e saúde, e estudando outras disciplinas, argumentou Conor Fitzgerald, testador de software da Poppulo, na RebelCon.io 2019. A aviação, por exemplo, aprende continuamente com seus erros, porém quando se trata do setor da saúde, coisas como a cultura e a hostilidade são desafios para a aprendizagem e a melhoria contínua.
O interesse de Fitzgerald pelo setor de aviação surgiu de um curso de coaching; o instrutor fez várias referências nas mudanças de cultura na aviação, por exemplo, a mudança para uma cultura sem culpa. Fitzgerald mencionou como ficou intrigado ao saber como os checklists haviam desempenhado um papel importante no excelente histórico de segurança da indústria da aviação.
Durante um curso de primeiros socorros, Fitzgerald percebeu que os serviços de saúde usavam heurísticas, mnemônicos e oráculos em seu processo. Foi então que decidiu explorar o que mais o setor da saúde usava que poderia ser valioso para os testes de software.
Fitzgerald também investigou uma série de outras disciplinas, incluindo economia e ioga. O aprendizado sobre economia veio do estudo de um curso de pós-graduação em negócios, de livros e podcasts sobre economia. Já a reflexão sobre a ioga foi devido a ser praticante há algum tempo. Fitzgerald mencionou que "a ioga é muito diferente das outras áreas, porém pode fornecer insights extremamente valiosos".
A indústria da aviação é fascinante pois tem uma histórico de aprendendizado contínuo a partir dos seus erros através do uso de checklists, gravadores de caixa preta, cultura não baseada na culpa, redesign de cockpit e Crew Resource Management (CRM). Esses aprendizados levaram ao seu excelente histórico de segurança, disse Fitzgerald.
Fitzgerald mencionou dois livros que contrastam as diferenças entre saúde e aviação, duas das mais importantes indústrias de segurança crítica no mundo atualmente: o Checklist Como Fazer as Coisas Benfeitas de Atul Gawande e o O Princípio Da Caixa-Preta escrito por Matthew Syed. Essas indústrias possuem várias semelhanças como, por exemplo, erros podem levar a ferimentos graves ou perda de vidas, ambos lidam com enorme complexidade, e tradicionalmente cirurgiões e pilotos têm status de herói.
A área da saúde, ao contrário da aviação, não tem uma cultura de aprender com seus erros e melhorar continuamente; isso levou a erros médicos que poderiam ser evitados, além de colocá-la como sendo a terceira maior causadora de mortes nos Estados Unidos - atrás apenas das doenças cardíacas e do câncer, com base em dados de saúde de 2013 dos EUA. Isso equivale a dois jumbos caindo do céu a cada vinte e quatro horas, disse Fitzgerald.
Fitzgerald salienta que parece haver dezenas de razões para que a setor da saúde não aprenda com seus erros, incluindo a cultura de culpa, apesar de parecer que a questão central seja a dissonância cognitiva, onde qualquer evidência é reformulada ou até mesmo ignorada. Porém, não são apenas os profissionais da saúde que sofrem de dissonância cognitiva; políticos e economistas tendem a ter o mesmo problema.
De maneira geral, quanto mais enviesado é o nosso julgamento, mais provável que manipulemos qualquer evidência que nos é questionada. A dissonância cognitiva anula o feedback e consequentemente a melhoria e a inovação, disse Fitzgerald.
O InfoQ entrevistou Conor Fitzgerald sobre seus aprendizados em outras disciplinas e indústrias.
InfoQ: O que te motivou a explorar outras disciplinas e indústrias? O que você planejou?
Conor Fitzgerald: Inicialmente minha curiosidade foi despertada pelos vários livros que li ao longo dos anos, onde abordaram diferentes disciplinas e indústrias. Gosto de ouvir o podcast Freakonomic e li vários livros sobre economia, como o Fora de Série - Outliers, escrito por Malcolm Gladwell, Tipping Point e David vs Golias. Além disso, nos trabalhos de testes que havia feito anteriormente, trabalhava em uma grande variedade de setores muito interessantes como, por exemplo, telecomunicações, finanças e jogos, cada um deles com características distintas.
Porém, o verdadeiro catalisador, que me fez explorar ainda mais, foi o fato de que dois grandes projetos de software em que trabalhei falharam. Após o término do segundo projeto, comecei a refletir o que fazia um projeto ser bem-sucedido.
Analisando o todo, parecia que as diferentes culturas em diferentes indústrias desempenhavam um papel crítico tanto na qualidade do software quanto no sucesso dos projetos de software.
InfoQ: Como a cultura e a qualidade estão relacionadas?
Fitzgerald: Henry Ford é famoso pela sua frase: "A qualidade é fazer bem as coisas quando ninguém está olhando". Poderíamos ver a cultura como um hábito, o hábito de "fazer a coisa certa", e a indústria da aviação fornece um excelente modelo de como uma cultura de qualidade aparenta ser.
Usando checklist para não esquecer etapas críticas. Uma cultura sem culpa, onde não há apontamento de dedos, sem sucessos ou fracassos, apenas o contínuo aprendizado. O gerenciamento de recursos de tripulação (Crew Resource Management - CRM) concentra-se na comunicação aberta e honesta e no trabalho em equipe, ao invés de incentivar o heroísmo.
InfoQ: Como podemos usar heurísticas e oráculos para nos tornarmos melhores nos testes?
Fitzgerald: Heurística é um método que está sujeito a erros, mas que resolve um problema ou ajuda na tomada uma decisão. A heurística não apenas melhora você como testador, enriquecendo seu conhecimento e experiência em testes, mas também pode ajudá-lo a comunicar-se com outras pessoas para explicar como você sabe onde possíveis problemas podem acontecer em uma feature e a lógica por trás de seu pensamento.
As dicas de teste utilizando a heurística de Elisabeth Henrickson é um excelente ponto de partida para aqueles que desejam aprender mais sobre a heurística de teste.
Oráculos são simplesmente o princípio ou mecanismo pelo qual reconhecemos um problema. Katrina Clokie diz: "Os oráculos me ajudam a descobrir a verdadeira razão pela qual eu acho que há um problema". Assim como na heurística, há um benefício duplo: se você considerar seus oráculos antes de começar a testar, terá uma variedade maior de riscos a considerar e áreas mais interessantes para explorar.
O FEW HICCUPPS mnemonic de Michael Bolton é útil quando se considera oráculos.
InfoQ: Como as coisas que você aprendeu impactaram seu papel como testador?
Fitzgerald: O maior impacto foi ter um foco maior na colaboração e comunicação entre a equipe de testes.
Um blog recente sobre os cinco estágios da colaboração de teste que escrevi aborda maneiras práticas de como melhorar a comunicação e a colaboração por meio do processo de desenvolvimento de software:
- Assegure que o problema que está sendo resolvido seja compreendido pela equipe e que as discussões sobre riscos e os usuários tenham sido feitas no projeto o mais cedo possível.
- Se possível, leve o feedback do cliente durante o desenvolvimento da funcionalidade.
- Concentre-se em pareamento das informações, mobbing programming, no passo a passo da equipe e na busca por bugs.
- A equipe inteira precisa decidir quando um recurso está pronto para ser lançado para testes beta pelos clientes.
- Os testadores aprendem mais sobre coaching e usam essas habilidades para treinar outras pessoas sobre o ofício de testar.